13.09 - Jyväskylä

A vida imita os ditados ruins, amiguinhos. Ontem o universo me deu mais uma cabal demonstração de que vaso ruim não quebra. Voltando da sauna para o hotel, nem dez da noite, passamos por uma interdição policial na calçada, tendo sido inclusive vagamente intimidados por um policial com aquela postura de "minha marra é inversamente proporcional ao tamanho do meu pintinho" a atravessar para o outro lado da rua. Imaginamos o que havia acontecido. Meu palpite foi de ataque cardíaco do zelador do prédio em frente. Hoje pela manhã, lemos no jornal ter se tratado de um tiroteio entre gangues, com uma pessoa baleada e morta. Poderia ter sido eu, se tivesse dado uma entrada a menos na água do lago. Mas não dei, né.

Assim sendo, ainda vivo, sigo me maravilhando com a simplicidade dos procedimentos para tomar um avião (simplesmente te enviam um QR code que é seu cartão de embarque, e dá acesso a tudo pela simples exposição da tela do celular) ou, mais ainda, um ônibus (simplesmente chega um e-mail dizendo "você comprou um assento na viagem tal"), e tá tudo resolvido.

No caminho para Jyväskylä, olhando pela janela do busão, me peguei constatando como é lento e insidioso este constante falecer, que nossa doença de vida nos condiciona a tentar eludir o quanto pudermos e, assim, perpetuá-lo enquanto ela dure.
Como a pedra de Roquentin (era uma pedra, né?), que inunda seu portador de náusea ao não conseguir ver nela nada além de apenas uma pedra, eu, que aos 15 anos teria me locupletado no êxtase de meramente vir visitar uma cidade com este nome, agora sentia as árvores e montes, e rodovias e cidadezinhas como pouco mais do que árvores e montes e rodovias e cidadezinhas, quando deveriam me parecer ser tanto mais, aqui no miolo distante da distante Finlândia. Mas vamos no acinzentando, nos amortecendo, não apenas o orgasmo que nasce na piroca demora mais a chegar e chega mais abafado e amornecido, mas também aqueles que nascem na alma vão se tornado fracos e distantes soluços, no lugar dos berros que já foram um dia, neste lento e contínuo apodrecer que mora dentro da bolsa marsupial do existir.

Dia miserável numa cidade meio merda. Choveu constantemente, às vezes forte, o dia todo, desde Tampere até a volta ao hotel agora há pouco. Cidadezinha minúscula, esparsa, sem nada realmente muito interessante pra ver. O próprio guia turístico cita apenas dois museus como atrações dignas de nota, e já parte pra falar da cidade seguinte. Às sextas-feiras, pelo menos, seriam gratuitos. Mas não eram mais, desde o começo do ano. Então nada a fazer por aqui, além de ir e voltar e ir e voltar pro hotel a 3,5 km de distância de tudo, que sei lá por que decidimos escolher, logo em cidade de maratona.


Maratona esta que é aquela de 4 voltas no mesmo percurso curto, em vez de bolarem uma rota de verdade. E, na retirada do material da corrida, só o papelzinho com o número de peito. Nada de camiseta ou absolutamente qualquer outro mimo.

A previsão para amanhã é de mais chuva. E eu estava preocupado com o sol inclemente que temia tomar na cabeça numa corrida com início ao meio-dia.


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